Nessa série de artigos gostaríamos de conversar sobre a temática do nosso autocuidado.
Fazemos então um convite para algumas reflexões:
- Nós, profissionais da saúde, vivenciamos sentimentos de pesar após a morte ou adoecimento de um paciente que acompanhamos?
- Se sim, conseguimos expressar de alguma maneira esses sentimentos?
- Se não, quais os impactos da não expressão ou não elaboração desses sentimentos?
O profissional de saúde lida com alguns conflitos na relação com o paciente ao longo de sua prática. Segundo a literatura, os principais são:
a) pessoal/subjetivo versus tecnológico/racional;
b) uma atitude empática de cuidado versus procedimentos técnicos e agilidade;
c) necessidade de controle versus livre expressão de sentimentos.
Além disso, perdas e morte ainda são tabus em nossa sociedade e dentro dos serviços de saúde não é diferente. Os sentimentos despertados pela morte e o adoecimento são com frequência silenciados, entretanto, é um assunto que inquieta.
O encontro entre o profissional de saúde e o paciente é, antes de tudo, um encontro humano. Portanto, é uma relação permeada por vínculos, identificações, trocas e sentimentos diversos. Seja porque construímos ao longo de nossa formação expectativas do nosso fazer profissional, o que define nossa identidade; porque aquele paciente lembra muito o nosso avô ou a nós mesmos; ou ainda simplesmente porque ele é uma pessoa com a qual nos apegamos. Contudo, com o estabelecimento do vínculo surge também a possibilidade de seu rompimento, o que é capaz de gerar intensos sentimentos de pesar quando ocorre a perda.
É importante considerar que o profissional de saúde que trabalha em oncologia, apesar do grande avanço dos tratamentos e sobrevida dos pacientes, passa por exposição diária ao sofrimento e à perdas (sejam dos pacientes, seja de condições de saúde, identidade, autonomia, entre outras). Ou seja, diariamente trabalha com a impotência e com a finitude. Segundo estudiosos do tema, lidar com a finitude do outro implica o sujeito entrar em contato com a sua própria.
Este contexto pode levar o profissional a experienciar fortes emoções, tais como sentimentos de inadequação, pesar, raiva, desilusão, frustração, sentimento de fracasso, desejo de evitar os pacientes e até desligar-se do trabalho. Diversos âmbitos de sua vida podem ser afetados (afetivo, físico, comportamental, social e espiritual), além do próprio âmbito profissional. Para lidar com estes sentimentos o profissional lança mão de defesas psíquicas, como por exemplo, o distanciamento, manifestado por uma insensibilidade ao sofrimento apresentado pelo paciente.
E porque isso acontece? Nos artigos a seguir abordaremos alguns conceitos que talvez nos ajudem a compreender esta questão.