Panorama histórico da Psicologia Hospitalar e da Psico-Oncologia no Brasil e mundo

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Desde a idade média, na medicina ocidental, predominou-se a ideia de separação entre mente e corpo e de que as doenças eram resultado de punições divinas. Essas concepções tiveram grande influência no desenvolvimento da medicina geral e da psiquiatria como unidades distintas e até hoje impactam de maneira significativa na interpretação de doenças.

No final do século XIX, porém, os estudos iniciados por Freud demonstraram que acontecimentos psíquicos poderiam ter consequências e manifestações sintomáticas em outras partes do corpo, o que abriu caminho para que pesquisas buscassem entender as relações entre os aspectos biológicos, psicológicos e sociais. Esta linha de pensamento deu origem aos estudos sobre a Psicossomática, que avançaram intensamente ao longo do século XX.

O interesse pela psicossomática foi responsável pela introdução da psiquiatria e da psicologia em hospitais gerais, o que parece ter iniciado (e avançado vagarosamente) em 1902.  Foi apenas após a segunda guerra mundial, porém, que esta prática avançou, em decorrência de estudos sobre sintomas de estresse pós-traumático e privação por institucionalização e devido à necessidade de maior comunicação entre equipe médica e paciente sobre os procedimentos a serem realizados (antes muitas vezes feitos sem o consentimento do paciente). No Brasil, em São Paulo especificamente, a psicóloga Matilde Neder foi contratada em 1954, para trabalhar no setor infantil da Clínica Ortopédica e Traumatológica do Hospital das Clínicas da FMUSP. Os médicos do setor sentiram necessidade do auxílio psicológico no trato com as crianças operadas.

O início da prática psicológica com pacientes oncológicos, porém, se deu mais tardiamente, em meados da década de 1970. Isso é associado ao fato de que, por muitos anos, o diagnóstico oncológico foi escondido do paciente pela equipe médica e pela família, devido ao estigma (ainda como consequência das ideias sobre punição divina) e ao caráter incurável da doença até o início do século XX. Conforme o avanço médico-científico possibilitou a cura e o aumento da expectativa de vida de pacientes oncológicos, a psico-oncologia foi instaurada no Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, em Nova Iorque, pela psiquiatra Jimmie Coker Holland para responder as seguintes questões:

• Quais são as respostas emocionais e comportamentais normais frente ao câncer? E quais são anormais ou disfuncionais, refletindo um sofrimento que possa interferir no tratamento?

• Qual a prevalência de problemas psicológicos diante do adoecimento por câncer que indicam a necessidade de psicoterapia?

• As reações emocionais afetam o curso da doença negativa ou positivamente?

• Quais as intervenções e métodos de enfrentamento que podem reduzir o sofrimento do paciente oncológico?

Em 1990, a Psico-Oncologia foi definida e fundamentada, pela própria Holland como uma subespecialidade da Oncologia, que procura estudar as duas dimensões psicológicas presentes no diagnóstico do câncer: 1) o impacto do câncer no funcionamento emocional do paciente, sua família e profissionais de saúde envolvidos no tratamento; 2) o papel das variáveis psicológicas e comportamentais na incidência e na sobrevivência ao câncer.

No Brasil, o primeiro “Encontro Brasileiro de Psico-Oncologia” ocorreu em 1989, em Curitiba, e em 1994 foi fundada a Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia. A presença obrigatória do psicólogo nos serviços de suporte oncológico como um dos critérios de cadastramento junto ao SUS se deu em 1998, com a publicação da Portaria nº 3.535 do Ministério da Saúde no Diário Oficial da União.

De acordo com a Profª. Draª. Maria Margarida Carvalho, atualmente, “o trabalho psicológico, seja de apoio, aconselhamento, reabilitação ou psicoterapia individual e grupal, tem facilitado a transmissão do diagnóstico, a aceitação dos tratamentos, o alívio dos efeitos secundários destes, a obtenção de uma melhor qualidade de vida e, no paciente terminal, de uma melhor qualidade de morte e do morrer. A ajuda psicológica às famílias, também sofredores nos seus medos e angústias, no seu despreparo frente à doença, na sobrecarga nas suas funções e tantos outros transtornos, tem sido considerada como essencial, nas pesquisas da área. A boa comunicação entre pacientes e familiares, bem como o apoio que os familiares possam oferecer ao paciente, têm sido considerados de maior importância para os pacientes. Por sua vez, os profissionais de Saúde que atendem os pacientes oncológicos, responsáveis por tratamentos invasivos, mutiladores, agressivos, que infringem grande sofrimento e nem sempre levam à recuperação e cura, também necessitam ajuda psicológica. Os profissionais de Saúde apresentam, em grande número, um alto nível de estresse”.


Fontes do artigo ou mais informações:

Carvalho, M. M. (2002). Psico-Oncologia: história, características e desafios. Psicologia USP, 13 (1). DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65642002000100008

Holland, J. C. (2002). History of Psycho-Oncology: Overcoming Attitudinal and Conceptual Barriers. Psychosomatic Medicine, 64(2). DOI:10.1097/00006842-200203000-00004 

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